Processo de criação

Como nasceu Sophie


Sophie nasceu, em minha mente, há mais de quinze anos. Era noite e eu enfrentava um dos meus poucos momentos de insônia. Aos vinte e poucos anos raramente temos problemas deste tipo. Mas, naquela noite, eu virava de um lado para o outro na cama, fritando nos lençóis. 

O sono estava perdido no meio de vozes e imagens que ficavam rodando em minha mente. A mesma cena, repetidamente. As mesas frases num looping hipnótico. Não tive escolha. Chutei os lençóis e fui despejar aquelas idéias invasoras em um papel qualquer.

Eu não tinha intenção de escrever um livro. Não me achava, nem de longe, capaz de elaborar uma história como a de Sophie, mas eis que ela me escolhera para narrar, ao menos, aquele momento da sua vida. E lá fui eu para o meu computador, um velho modelo, ainda com a tela monocromática! Acredite se quiser...

Ao iniciar o texto, foi como se uma comporta se abrisse e as vozes voltaram se debatendo umas às outras, atropelando as imagens que surgiam e, após uma batalha acirrada entre meus pobres dedos no teclado e os invasores noturnos em minha mente, as dez primeiras páginas do que viria a ser As Vidas de Sophie estavam prontas.

Dormi como um guerreiro que retorna à casa. Esgotada, mas com o coração radiante por ter cumprido a missão.

Depois desta noite, lá pelos anos de 1997, nunca mais peguei aquelas páginas novamente para ler ou dar continuidade. Minha vida mudou. Eu mudei! Literalmente, mudei-me de casa, de bairro, de trabalho, de namorado, de marido, de cidade, de país! Em quinze anos, minha vida correu por rumos inesperados e, numa bela tarde quente de um verão italiano, estava eu sentada na minha loja de lingeries, sem muito o que fazer. Era início de agosto e a cidade estava (sem nenhum exagero) às moscas. Hábito da pequena Reggio Emilia durante o verão, quando um grande percentual dos moradores fecham seus negócios e casas e vão para o litoral passar duas, três semanas de férias.

Uma grande parcela, menos eu, claro. Portanto, estava eu sentada à minha mesa de trabalho, já ciente de que os clientes não viriam mais naquele dia, pensando em como aproveitar melhor o meu tempo "livre" e comecei a escrever contos, por puro prazer e fui pegando gosto pela escrita. Verdade seja dita, gosto pela escrita eu sempre tive. Fui colaboradora como cronistas para vários sites e blogs, além do meu próprio, Que tal um cafezinho. Na verdade, passei a gostar ainda mais, ao ponto de inscrever duas de minhas crônicas em um concurso, no qual fui uma das vencedoras e o resultado está no livro Cronicidades, à venda pelo Clube dos Autores, neste link

Participar de um livro me levou, imediatamente, àquelas páginas quase esquecidas, descarregadas de uma mente insône mais de quinze anos atrás! Obviamente eu não as tinha mais. Senti uma onda quente me invadir e chacoalhar-me por dentro. Era Sophie pulando de alegria, mas eu não sabia. Ainda.

Sentei-me diante do computador e, quase imediatamente, as vozes de quase duas décadas atrás voltaram. As imagens ressurgiram com nuances ainda mais detalhadas. Comece a digitar sentindo uma euforia que há anos não sentia. As horas passaram tão rápido que, quando dei por mim, havia passado da hora de fechar a loja. Senti uma tristeza tão grande por deixar Sophie e sua vida recém começada pra trás!

Sentei-me na minha bicicleta (meio de transporte mais usado, barato e saudável nas cidades da Europa) e fui pedalando os mais de quatro quilômetros até em casa com a mente voltada para apenas uma coisa: Sophie e as próximas cenas do livro.

E assim nasceu Sophie. De uma noite insône, no Brasil, no final do século XX, para uma tarde escaldante do verão italiano, no início da segunda década do século XXI. Três meses depois, em meados de outubro, As Vidas de Sophie estava pronto para ser publicado. Saiba como foi a decisão de fazê-lo gratuitamente no link Por que gratuito?, aqui do blog.

(Foto: manipulação de imagem, criação de Érika Bento Gonçalves)

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